Andrea Ladislau

Bebê Rena e o delírio romântico

Série da netflix levanta discussão sobre a erotomania

É muito comum, principalmente na fase da adolescência, o despertar do desejo romântico por um ídolo, uma pessoa famosa ou de status mais elevado. É um contexto propício para que vá se nutrindo um amor romântico idealizado que, com a chegada da vida adulta, também amadurece e se transforma em admiração e carinho. Mas e quando esse desejo extrapola a fantasia distante, perdura, intensifica-se e se distorce a ponto de a pessoa delirante acreditar irrevogavelmente que o outro retribui esses sentimentos amorosos?  Essa é uma das temáticas que vêm sendo levantadas por especialistas em relação à série “Bebê Rena”. Como profissional da área, venho observando as discussões sobre a possibilidade de manifestação de um tipo de síndrome psicológica rara no comportamento da personagem Martha: A Erotomania,o delírio romântico. Mas o que seria essa síndrome? Como se manifesta, quais são as causas, como buscar e conduzir um tratamento?

O que é a erotomania?

A Erotomania ou Síndrome de Clérambault é um tipo de síndrome psicopatológica caracterizada por um delírio romântico no qual a pessoa adoecida tem convicção, certeza absoluta e irrevogável de que um outro alguém,, normalmente uma celebridade ou alguém de uma classe social mais elevada em relação a dela (ou mesmo uma pessoa de beleza excepcional!) está completamente apaixonada por ela. Dentro do desejo delirante, a pessoa que sofre com Erotomania apresenta aspectos de delírio romântico intenso em relação ao outro. Essa síndrome é bem rara e multifatorial, pois está relacionada a questões genéticas e se agrava com o tempo devido a algum tipo de estresse psicológico extremo sofrido pelo indivíduo.

Essa crença delirante impacta significativamente a vida de quem sofre com ela, fazendo com que ela perca o senso crítico do limite do saudável e permitido em relação à idolatria de uma pessoa famosa (ídolo), de status mais elevado ou de aparência muito cobiçada. Os pensamentos de delírio romântico podem afetar qualquer tipo de pessoa e suas causas variam conforme a predisposição psicogenética de cada um, de acordo com uma série de fatores, como: traumas na cabeça; abusos na infância; esquizofrenia; negligência na infância ou outros transtornos de cunho psiquiátrico.

A Martha de Bebê Rena é uma erotomaníaca?

É possível que seja esse o quadro da personagem Martha em “Bebê Rena”.  O comportamento obsessivo e impulsivo que ela apresenta é típico da síndrome: ela age motivada por um amor romântico intenso alimentado em relação ao personagem Donny, o qual Martha acredita com todas as suas forças que retorna sua paixão. Mas, fora da ficção, como identificar que essa síndrome pode ser a causa de um sofrimento emocional muito violento? É preciso se atentar às tendências infundadas, fora da realidade. A pessoa erotomaníaca acredita que o(a) seu(sua) pretendente está sempre “dando sinais”, até mesmo quando nem se conhecem. A idolatria excessiva também é uma pista do adoecimento. Além disso, o erotomaníaco se mantém muito reservado, não se relaciona romântica ou sexualmente com ninguém (costuma desejar se guardar para seu “amor”).

Existe tratamento para pessoas erotomaníacas?

Portanto, em resumo, essa “paixão” desmedida reflete um excesso de desejo de amar e ser amado, de ser notado e cuidado. E, como todo excesso, é prejudicial ao ser humano. O tratamento precisa ser efetivo para trabalhar as falhas, gatilhos e crenças enraizadas que levam essa pessoa a fantasiar um amor romântico com uma pessoa que, muitas vezes, nem a conhece.

A psicoterapia individual, aliada ao suporte de uma rede de apoio e também à intervenção medicamentosa com antipsicóticos, é fundamental para a excelência do tratamento. É imprescindível reforçar, entretanto, que o sucesso da abordagem terapêutica depende do afastamento do objeto de delírio romântico. 

Ou seja, é preciso que todos os acessos de informações do erotomaníaco à pessoa desejada sejam anulados, para que o equilíbrio mental seja recobrado, a autoestima recuperada, assim como o amor próprio. 

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Dra. Andréa Ladislau / Psicanalista