Andrea Ladislau

A psicanalista foliã

 O Carnaval do ponto de vista de quem cuida da saúde mental

A relação do ser humano com o Carnaval vai muito além do sentimento alternado entre amar e odiar. Há aqueles que amam e vivem essa época do ano como se não houvesse o amanhã. Se jogam de verdade, com o objetivo de compensar toda espera de quase 365 dias para extravasar a alegria e a possibilidade de dar vida a outros personagens através do uso de fantasias.

Outros, já encaram os dias de folia como uma oportunidade de ouro para descansar e aproveitam o feriado prolongado longe dos festejos de Momo. Mas, seja como for a conexão com o Carnaval, uma coisa é certa: é um período rico em aspectos emocionais que suscitam uma análise psicanalítica do ponto de vista dos desejos e dos limites. 

Para os apaixonados que se dispõem a brincar, curtir e extravasar sentimentos e emoções através da dança e do samba, o Carnaval é a oportunidade perfeita para se desconectar de cobranças e preocupações cotidianas. Um momento único que, do ponto de vista psicanalítico, desperta funções positivas no organismo, como: o estímulo à produção de endorfinas que fortalecem o sistema imunológico; exercícios físicos através do samba e da dança; elevação da autoestima; diminuição da irritabilidade, da ansiedade e do mau humor.

Como psicanalista e eterna foliã, apaixonada pelo Carnaval, defendo que, seguidos os cuidados e evitando os excessos e exageros, a folia faz bem para o corpo, a alma e, principalmente, para a mente. Além disso, considerando o aspecto cultural, ele também contribui para divulgar, através dos enredos que são desenvolvidos ao longo de todo o ano pelas agremiações, letras belíssimas e cheias de conteúdo histórico que contam e desvendam muitos segredos de nossa cultura popular brasileira.

Carnaval e as emoções

O Carnaval tem essa característica facilitadora de rompimento, mesmo que temporário, com os papéis de censura. É tentador extravasar e se libertar do personagem usual, aquele que desempenhamos durante todos os dias e nos exigem uma postura mais formal. A folia estimula e oportuniza a vivência de escapes emocionais, nos quais podemos expressar sentimentos que enfraquecem a famigerada castração social.

É exatamente neste ponto que entra a importância de reconhecimento dos limites pessoais, já que muitos aproveitam essa época do ano para extrapolar em excessos e abusos, em nome de uma sensação de fuga da própria realidade. Esquecem que o bom senso ajuda a balancear o bom e o ruim, o certo e o errado, preservando a integridade humana e os cuidados essenciais com a saúde do corpo e da mente.

Seja dentro ou fora da folia, o universo carnavalesco poderia ser melhor traduzido pelo sentimento de gratidão e comemoração à vida. Uma reverência ao amor e à resiliência da cultura brasileira recheada por letras que resgatam fragmentos históricos, entregando emoção e alegria através do samba. Uma tradição que movimenta famílias e estimula o espírito competitivo e o sentido de pertencimento dos componentes das agremiações.

Enfim, a lista de benefícios não termina com o que eu já mencionei, mas, para aproveitá-los, o autoconhecimento dos seus limites é essencial. É preciso se viver um Carnaval saudável e leve, focando nos cuidados com a saúde física e mental  através do controle dos excessos (bebidas, drogas ilícitas, horas sem dormir, exposição ao sol sem proteção, falta de hidratação do corpo…) e do respeito aos próprios limites pessoais, sem querer viver os quatro dias de folia em um só. Ou seja, descansando ou aproveitando a folia, com ou sem fantasia, o importante é carnavalizar com responsabilidade e equilíbrio.  

Dra. Andréa Ladislau / Psicanalista