A dor de um luto pouco compreendido
Falar sobre o luto é sempre uma abordagem muito difícil. Quando se trata do luto gestacional, uma das experiências mais difíceis na vida de uma pessoa, é ainda mais dolorosa. Um tipo de luto específico, silencioso, que requer muito acolhimento e validação da dor.
O caso de Tati Machado e a repercussão emocional
Nos últimos dias, a apresentadora Tati Machado anunciou a perda de seu bebê no oitavo mês de gestação. E nos perguntamos: como fica o emocional dessa mulher e como ela pode elaborar melhor esse luto?
A sociedade ainda invalida a dor
Infelizmente, ainda vivemos em uma sociedade que invalida a dor das perdas. Invalida os sentimentos ao não acolhê-los, emitindo opiniões do tipo: “Tudo bem. Você é nova e pode tentar de novo”.
Não. Não está tudo bem. Essa dor é legítima e precisa ser reconhecida e acolhida.
O direito de sentir
É importante que essa mulher enlutada possa externar suas emoções e se permitir chorar, sentir raiva, tristeza, frustração ou qualquer outro tipo de sentimento. Ela não precisa superar, mas sim elaborar as emoções negativas do luto e encarar suas fases, vivenciando-as, para não entrar em um processo de depressão profunda.
O tempo do luto é único
O luto não tem um prazo. Como encarar esse momento e, ao mesmo tempo, preservar a saúde mental dessa mulher?
O corpo e a mente também sofrem com a perda e, em primeiro lugar, é preciso evitar comparações ou pressões internas que julguem e imponham um ritmo padronizado do tipo: “Já deveria estar melhor”. Cada pessoa tem seu tempo e sua forma de elaborar as fases do luto. E o padrão não cabe nesse caso.
Rede de apoio e escuta qualificada
Além disso, encontrar o acolhimento numa rede de apoio que ofereça mais compreensão e menos acusações é fundamental.
A visão da Psicanálise sobre o luto gestacional
Simbolicamente, a Psicanálise enxerga o luto gestacional pela ótica de que a gravidez é um período em que a mulher se encontra em um ponto muito particular de sua estrutura psíquica: ela está em relação com um outro (o bebê) que também é, em parte, ela mesma.
A perda, então, atinge profundamente o narcisismo, o corpo, a identidade e o lugar simbólico da maternidade. Por isso, surge a necessidade de reconhecimento da existência e importância daquela vida, ainda que breve. Uma visão profunda que auxilia no processo de luto.
A negação da morte e a urgência em eliminar a dor
A realidade é que não sabemos lidar com a morte. Agimos, instintivamente, na direção da eliminação da dor da perda, e não estamos preparados para tratar isso. Porém, o luto não é doença, assim como a tristeza não é depressão e, é um equívoco acreditar que existe um tempo cronológico para essa tristeza ou essa dor terminar.
O tempo certo para cada um: kairós
O luto não se define por seu tempo de duração, mas sim pelo processo de elaboração sobre a morte, que é feito por cada um.
A maneira como compreendemos o momento do luto pode ser crucial. Temos um tempo interno, que se chama kairós, e ele sim irá designar o tempo correto em que essa dor será amenizada, diferentemente do tempo chronos, o tempo que mede os dias e as horas.
A importância do acolhimento e do amor
Enfim, o luto gestacional vivenciado por qualquer mulher, famosa ou não, se for encarado com os devidos cuidados e o apoio necessário, certamente, irá ajudar a ressignificar a perda, a lidar com a culpa e com a tristeza profunda, pois é uma dor válida e a mulher tem que sentir que ela não está sozinha.
Já que o luto gestacional é profundo, merece ser tratado com respeito, sensibilidade e amor.
Dra. Andrea Ladislau / Psicanalista