São muitos os efeitos psicológicos positivos que a retomada das aulas presenciais pode provocar nas crianças
O ensino remoto tornou-se uma realidade nos últimos 2 anos em função da pandemia. Se para os adultos o modelo de trabalho home office exigiu grandes adaptações, as nossas crianças também passaram por este desafio quando as escolas adotaram o estudo remoto para proteger contra a Covid-19.
Com o aumento do número de adultos e crianças vacinados, a retomada das aulas presenciais passa a ser mais palpável e real. Voltar ao ritmo normal de um ano letivo suscita aspectos desafiantes em relação ao impacto desse processo, já que tantos alunos, docentes e responsáveis viveram desafios estruturais e emocionais importantes no momento de isolamento. Porém, essa retomada é cercada por cuidados e também aspectos emocionais que precisam ser observados.
Novas estratégias são exigidas para manter a segurança de todos na volta às aulas presenciais. Além do passaporte vacinal que poderá ser obrigatório, também é preciso o acompanhar a retomada dos cuidados e protocolos de higiene e limpeza, assim como um maior acolhimento dos alunos, das famílias e do corpo organizacional de todas as instituições de ensino.
Um novo normal
Sem sombra de dúvidas que há uma certa sensibilidade, insegurança e ansiedade de todos em relação aos acontecimentos dos últimos anos. O trabalho pedagógico, assim como diversas outras atividades, precisou ser reinventado. Aulas virtuais foram implementadas e a rotina dos alunos, responsáveis e professores foi totalmente modificada após a constatação de uma pandemia. Fato que exige hoje um maior alinhamento entre a escola e a família na tentativa de fortalecer o papel de ambos na construção do saber das crianças e jovens.
Mas não foi só o trabalho pedagógico que passou por uma grande adaptação. O “novo normal” alcançou todas as esferas da vida e a preocupação com a segurança e saúde, no sentido de se evitar contaminações, passou a ser uma realidade. Nos vimos diante da necessidade de uma escuta ativa e eficaz, além de uma maior parceria entre o corpo docente e os familiares, que também são afetados pelo peso desse cuidado.
Além da necessidade de vacinação de nossas crianças e jovens, o rigor e a eficiência com a segurança dos protocolos de cuidados devem estar garantidos. Por mais que o empenho e a dedicação de docentes, coordenadores, diretores e pais sejam intensos, o principal é ter a certeza de não haver riscos de contaminação pelo coronavírus nas escolas.
Aspectos emocionais e psicológicos da volta às aulas
Sob o prisma da psicanálise, temos que ressaltar o aspecto relativo à criação de expectativas. Os alunos desejam, assim como os adultos, a normalidade, onde possam desenvolver o senso de pertencimento, socializar e interagir com pessoas de sua idade. Fato que torna de extrema importância o desenvolvimento dos protocolos de segurança a fim de incentivar e fortalecer uma convenção de cuidados onde todos possam sair ganhando.
Analisando todos os personagens desse cenário, de um lado temos o educador que sofreu com as pressões emocionais, o medo, a carga e o peso da responsabilidade da proteção, além da condução e orientação de uma turma inteira de jovens que o enxergam como um porto seguro. Alunos esses, ceifados por um isolamento social abrupto, onde foram privados do convívio com os amigos e do contato afetuoso e orientador de seus educadores.
Além deles, encontramos os responsáveis que também sentiram na pele os impactos da violência psicológica a qual fomos expostos. Caberá aos educadores e gestores um maior apoio às famílias, desde ouvir as suas demandas e inseguranças, geradas por perdas ou preocupações, até o apontamento e observação da mudança de comportamento dos alunos.
A verdade é que todos nós nos deparamos com a insegurança dos riscos de contaminação por um vírus invisível que nos isolou socialmente, modificou as regras de convivência e virou de ponta cabeça a rotina de muitas famílias.
Desafios de lidar com o que passou
Temos que compreender que, desde 2020, quando a pandemia teve início, vivenciamos a limitação dos afetos, paralisando o planeta por conta do decreto do distanciamento social e do isolamento, o que fez com que o mundo vivesse algo inexplicável e sem precedentes. A saúde psicológica da maioria das pessoas foi devastada. A priorização do material humano e a cautela com os aprendizados adquiridos durante o isolamento social, complementam a necessidade de encontrarmos respostas e acolhimento dentro de todo esse contexto.
Com a volta às aulas presenciais, todos os sujeitos envolvidos na dura missão de tentativa de controle de suas emoções, dúvidas e medos, agora são desafiados a uma nova adaptação cotidiana que não alimente mais medo e pânico, mas busque pela racionalidade.
Neste contexto, é possível que algumas intervenções dos psicólogos sejam necessárias para orientar e direcionar crianças e adolescentes, de modo que possam desenvolver inteligência emocional. Ou seja, a colaboração de profissionais da saúde mental pode auxiliar os pais, responsáveis e educadores e estabelecer estratégias de regulação emocional, onde empatia, compaixão e outras habilidades sociais possam ser desenvolvidas ou aprimoradas.
Aos pais, alunos e profissionais da educação, o desafio está em não negligenciar a vulnerabilidade e a necessidade de se construir conteúdos afetivos que sustentem o atendimento a uma demanda legitimada pela preocupação dessas famílias, pela ansiedade dos alunos e pelo desejo em voltar a uma normalidade tão almejada por todos.
Papel psicológico da escola
A escola tem um papel psicológico fundamental na formação do ser humano. É o lugar do encontro onde jovens, adolescentes e crianças convivem, socializam e aprendem umas com as outras e com os professores. Com a volta às aulas presenciais, esse ambiente está inserido na conjuntura de esperança, assim, é fundamental que o retorno seja feito com cautela. Dentro da realidade de cada um, é preciso que haja investimento em soluções que atendam coletivamente, de forma saudável, segura e cheia de afeto, todos os protocolos de higiene e saúde, resguardando o direito legal à educação plena da criança e do adolescente.
Voltar ao convívio social, sair de casa com segurança, estar com os amigos, receber os cuidados de professores e alimentar seu lado intelectual através do saber e aprendizado adquiridos, sem dúvida, são benefícios importantes e superaguardados pelos alunos. Agora é o momento de conversar sobre como a escola vai funcionar e de reforçar os combinados para todos aqueles que tiveram suas vidas escolares modificadas desde o início da pandemia.
Ou seja, é preciso atender ao coletivo de forma segura, saudável, empática e com muito afeto. Um afeto extensivo a todos os envolvidos na mais linda missão de educar e transmitir o conhecimento ao próximo. O advento das vacinas de crianças chega para preservar e evitar um risco intolerável de retrocesso que possa voltar a traumatizar a população no caso de um retorno ao isolamento social restrito, que marcou o inconsciente e a mente de alunos, professores, pais e equipe docente em geral.
Dra. Andréa Ladislau.
Psicanalista.