Andrea Ladislau

Filtros embelezadores e a manipulação da própria imagem nas redes sociais

O que o uso frequente dos filtros embelezadores e o vício da manipulação da própria imagem nas redes sociais pode causar a longo prazo

A maximização do belo e perfeito propagado pelas mídias ganha apoio em potencial, popularizando-se com a utilização exagerada de ferramentas como filtros embelezadores que evidenciam uma necessidade em apresentar uma aparência distante da realidade, marcada pelo efeito computadorizado de medidas simétricas perfeitas para impressionar nas redes sociais.

Esses filtros embelezadores integrados aos dispositivos móveis permitem a manipulação da própria imagem, compondo feições dignas de modelos de capa de revista. Lábios aumentados e mais carnudos, maçãs do rosto saltadas e rosadas, olhos grandes e mais claros, nariz afilado, sobrancelhas desenhadas e arqueadas, cílios expressivos, peles claras ou bronzeadas, dentes brancos, maxilares mais finos e sardas fictícias são algumas das tantas modificações aplicadas — em muitos casos, de forma severa — através de cálculos matemáticos, que promovem uma simetria facial.

O desejo desenfreado da perfeição

O exagero no uso dos filtros virtuais destaca o desejo da perfeição, estabelecendo um senso de estética e padronizando perfis que imitam as influenciadoras que estão mais em evidência. De uma certa forma, percebemos a perseguição desenfreada, principalmente entre os jovens, por uma imagem com filtro que renegue sua aparência, dentro de uma falsa realidade, promovida por um engano estabelecido.

Relatos apontam que algumas adolescentes estão tão habituadas a estes recursos que só se apresentam nas redes, seja por fotos, vídeos ou stories, utilizando filtros embelezadores incorporados ao seu perfil. Com isso, por conta do uso indiscriminado das ferramentas, podemos perceber que os perfis estão ficando muito parecidos visualmente. Uma imagem  manipulada e mecanizada, em que todos agora possuem um nariz afilado e a pele homogênea e perfeita.

Apesar do tímido movimento de defesa de uma exposição sem pudores ou receios das imperfeições corporais, os centros de estética já incorporaram padrões exigidos pelas clientes que desejam a “sobrancelha arqueada do Instagram” e a “boca carnuda da influenciadora digital famosa”. Cirurgiões plásticos perceberam o aumento dos procedimentos de rinoplastia e bichectomia, além da explosão da queridinha do momento: a harmonização facial, seguida pelos preenchimentos labiais que, conforme relatos, ajudam a “sair melhor em selfies”.

E onde foram parar os nossos rostos reais? As olheiras marcadas? As manchas na pele causadas pela acne acentuada? E as imperfeições naturais provocadas pelos sinais da idade que os filtros insistem em esconder?

Não tenham dúvidas quanto à afetação do bem-estar e do psicológico do indivíduo que vive a partir da manipulação da própria imagem, alimentando, por meio da insatisfação com sua aparência, uma tendência à baixa autoestima e possível depressão, desconstruindo o real e atendendo aos apelos de uma sociedade que cultua o belo e promove uma extrema exposição através do vício danoso da manipulação da própria imagem.

A necessidade de pertencer a um padrão de beleza inalcançável

A manipulação da própria imagem por meio de algoritmos impostos pelos padrões de beleza, sobrepondo-se a uma versão distorcida de nós mesmos, traz à tona uma questão inerente ao ser humano: a necessidade de pertencimento — neste caso, o desejo e a vontade em pertencer ao grupo dos belos e perfeitos, dos rostos simétricos classificados por rótulos, em contraponto à busca de expressão de sua própria individualidade que, na maior parte das vezes, justifica-se por um sentimento de insuficiência e competição.

Podemos afirmar, portanto, que existe aí uma real necessidade de afirmação da imagem que queremos que o outro tenha de nós. E, lógico, na contramão, o corajoso é aquele que se expõe de cara lavada, sem qualquer alteração tecnológica do seu perfil.

Esteja atento aos efeitos psicológicos das redes sociais

O exagero nesta utilização dos filtros embelezadores pode alimentar o sentimento narcísico do ser humano e aumentar, assim, sua necessidade de espelhamento, pois estimula o desejo de que o outro o perceba sempre belo e perfeito, expondo, de forma excessiva, suas emoções e promovendo distorções depressivas através de crises de ansiedade e de uma possível sensação de opressão, uma vez que não consegue ser feliz sendo ele mesmo, da forma como se é.

Nosso sinal de alerta deve ser disparado quando essas ferramentas tecnológicas atiçam a psique a ponto de tornarem-se indispensáveis, atropelando a realidade e extrapolando desejos e satisfações. É importante estarmos atentos a estes efeitos psicológicos das redes sociais, que superestimam a nossa imagem e podem desencadear o que chamamos de Síndrome da Decepção Continuada, ou seja, quando a pessoa não mais se reconhece como é e sua própria imagem  aquela real, não lhe agrada, só conseguindo aceitar a imagem distorcida e perfeita aprovada pela sociedade.

Portanto, a busca e predileção por imagens e perfis mais positivos e esteticamente mais atraentes refletem uma falsa realidade e a mais pura rejeição da imagem real, em prol de uma imagem desejável e aceitável por todos. Perceba que, quando isso acontece, também está sendo rejeitado o amor próprio e evidenciado os mais variados complexos, camuflados por uma necessidade de reconhecimento.

Cultive amor próprio e colha aceitação

Enfim, é importante indagar-se onde está seu amor próprio. Por que não se aceita como é? Esconder-se através de filtros embelezadores, seguindo uma tendência narcísica e exibicionista, demonstra uma urgente necessidade de ajuste do seu humor, com risco de desequilíbrio de sua saúde mental, em que a falsa realidade, de forma inconsciente, força a divulgação, para o outro, apenas do que é belo, sem as imperfeições naturais que caracterizam e o individualizam como ser humano, eliminando sua individualidade através das redes sociais.

Sendo assim, se faz necessário refletir sobre seu comportamento e postura nas redes sociais. Fuja da imposição neurótica de uma vida de aparências, pois o ser humano não morre quando o coração para de bater, ele morre quando deixa de se sentir e se perceber de verdade.

Dra. Andrea Ladislau, psicanalista.

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